col. Biblioteca-Museu República e Resistência

Escrito durante a guerra, e editado pela primeira vez ainda em 1918, ano em que é assinado o armistício que pôs fim ao conflito mundial, e em que Portugal ainda aguardava o regresso dos seus soldados quer da frente da guerra, quer dos campos de prisioneiros, o livro que hoje apresentamos conheceu varias reedições (a última das quais em 2014). O seu autor era bem conhecido do público português especialmente do lisboeta, através das crónicas humorísticas que escrevia para a imprensa da época, e pelas obras teatrais onde retratava, de forma bem humorada e certeira a burguesia da cidade.

André Brun (1881 – 1926), descendente de franceses emigrados em Portugal, ingressou no exército, na arma de Infantaria, após lhe ter sido negada a entrada na Marinha, sua primeira escolha. Paralelamente à sua vida militar, começou a colaborar na imprensa, nomeadamente no Novidades, e no Suplemento Humorístico de O Século com grande êxito. As suas crónicas acabariam por ser editadas em volumes autónomos dado o seu sucesso (Sem pés nem cabeça; Cada vez Pior; Sumário de várias Crónicas, por exemplo). Foi ainda autor de outras obras cómicas como a bem conhecida Maluquinha de Arroios, peça teatral, A Vizinha do Lado (adaptada ao cinema já depois da sua morte) e Praxedes, Mulher e Filhos, e Outra vez Praxedes, divertidos retratos de uma pequena burguesia lisboeta em ascendência e modernismos deslocados.  

Diz-se de A Malta das Trincheiras que é um livro bem humorado sobre a participação portuguesa na I Grande Guerra. Mas é muito mais do que isso. É um fidedigno relato ocular de episódios da vida na frente de guerra, narrados de modo brilhante que nos arrasta para o ritmo dos próprios ataques, ou para a pacatez do dia a dia de quem esteve meses e anos nas “trinchas”, ou ainda nos torna em ansiosos leitores que acompanham a angustiada espera noturna de um possível ataque alemão. Em simultâneo, não podemos deixar de sorrir (e de nos rever) com a caracterização do soldado português (Folgadinho, de seu nome): bem humorado, conversador, rápido a aprender as 18 palavras essenciais para a sua sobrevivência (e a “traduzir” à letra as que desconhece), corajoso, inventivo na procura de soluções para a sua vida. Ou com a forma como critica as altas patentes e a (des)organização do  Corpo Expedicionário Português (veja-se, por exemplo o capítulo “Repartição dos humoristas”). Tudo isto narrado com graça e com o conhecimento directo de quem o viveu, ou como afirma o próprio André Brun:  “é apenas uma documentação pitoresca um relato do que eu vi com os que a terra há-de comer, olhos da minha cara e mortos da minha pátria”.

Ana Homem de Melo | Lisboa, GEO, Março 2015