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Biblioteca-Museu República e Resistência |
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Com capa desenhada pelo pintor modernista Adriano Sousa Lopes,
que esteve na frente de guerra em 1917, apresentamos
Calvários da Flandres, escrito em 1918 e editado em 1920. O
seu autor, Augusto Casimiro dos Santos (Amarante, 1889-Lisboa,
1967), conheceu de perto o que descreve sob uma linguagem muitas
vezes poética, pois era militar de carreira. Serviu no Corpo
Expedicionário Português, exatamente na Campanha da Flandres,
para onde embarcou em Junho de 1917, como tenente, tendo sido
elevado ao posto de capitão (Setembro de 1917) e condecorado com
a Medalha Militar de prata da classe de comportamento exemplar,
a Cruz de Guerra, fourragère da Torre e Espada, Ordem de Cristo,
Military Cross, e com o grau de cavaleiro da Ordem de Santiago
da Espada. Após a Guerra foi professor no Colégio Militar e, sob
o comando de Norton de Matos, Governador do Distrito do Congo e
Secretário Provincial e Governador interino de Angola até ao
golpe de 1926. Durante o regime de Salazar tomou parte em vários
movimentos da oposição, nomeadamente, na Revolta da Madeira
(1931) o que lhe valeu ter sido demitido do Exército e
desterrado por três anos para Cabo Verde. Foi ainda apoiante da
candidatura do General Norton de Matos.
A sua entrada no mundo das letras fez-se em 1906, tendo
assinado, ao longo da sua vida, cerca de três dezenas de obras
dedicadas à poesia, à história, à presença e administração
portuguesas em África. Colaborou em diversos periódicos
nomeadamente
Serões,
Amanhã,
Atlântida, A Águia, Seara Nova.
Os calvários são tema recorrente da pintura flamenga e sinónimo
de dor e sofrimento. Não é por, isso, despiciente a escolha
deste título para o livro que, na sequência de uma outra obra do
autor (Nas Trincheiras da Flandres), nos traz um vivido relato
das condições em que se desenrolou a nossa participação nos
campos de guerra flamengos. Aqui, Augusto Casimiro critica
duramente a posição anti-belicista assumida em Portugal, após a
subida ao poder de Sidónio Pais, personalidade que ele
contestaria enquanto republicano. Após um capítulo inicial onde,
a largos traços, narra as relações entre Portugal e a Flandres
nos campos de batalha ao longo da história, Augusto Casimiro
entra a traçar, agora em pormenor, os acontecimentos e o estado
de espírito das tropas portuguesas nas vésperas da Batalha de La
Lys: a falta de ânimo, a desilusão com o governo e as suas
constantes e reiteradas promessas (nunca cumpridas) de uma breve
rendição das tropas, as notícias de que em Portugal se defendia
a nossa retirada, a falta de treino das chefias, tudo contribuía
para que o soldado se sentisse abandonado pelos seus.
Acompanhamos, com crescente interesse, porque em crescendo segue
a narrativa, os preparativos do lado alemão para um ataque às
nossas posições e os nossos esforços para debelar a grandeza do
ataque; vivemos em pormenor a Batalha de Lacouture, no vale do
Lys, até uma inevitável rendição; e pesarosos, assistimos à
prisão das tropas aliadas. Nos capítulos que têm o título da
obra o autor regressa à ideia do abandono das tropas lusas,
exprimindo o sentimento que perpassava pelos seus soldados
depois da Batalha de 9 de Abril e tornando claro para o leitor o
sofrimento dos que combatiam: “Quem de nós se lembrava?”,
pergunta. E acrescenta: “Sobre os plainos da Flandres erguem-se
calvários. Crucificadas, exangues, agonizam almas lusíadas.
- Pátria, Pátria, porque nos abandonaste?...”
Ana Homem de
Melo | Lisboa, GEO, julho 2015
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