|
col.
Biblioteca-Museu República e Resistência |
|
Natural de Bragança, Godofredo Humberto Beça Salgueiro
(1878–1924) frequentou a Escola do Exército, e esteve colocado
no Serviço de Administração Militar. No entanto, não ultrapassou
o posto de alferes, pois em 1902 teve de desistir após um
acidente que o tornou inapto para o serviço militar. Iniciou
então a sua carreira no jornalismo na imprensa da região de
Aveiro, tendo sido redator e diretor de periódicos da Murtosa e
da capital de distrito (nomeadamente de O Democrata,
jornal local do Partido Republicano) e colaborador em
alguns periódicos nacionais e locais. Foi ainda professor,
escrevendo vários livros escolares sobre contabilidade,
escrituração, aritmética, francês, geografia, por exemplo.
Dedicou-se ainda à poesia e a temas de história, tendo publicado
alguns estudos sobre os castelos da raia portuguesa.
A obra que agora se apresenta resulta de uma colaboração de
Humberto Beça, com o título Episódios de Guerra, no
jornal O Democrata de Aveiro no ano de 1916, ano em que
Portugal entra ativamente no conflito mundial. Na sequência da
nossa entrada na guerra surgiram alguns movimentos de cidadãos
para ajudar ao esforço de guerra. Entre eles, destacou-se a
Junta Patriótica do Norte (fundada em Abril de 1916) que visava,
por um lado, prestar assistência aos combatentes e às suas
famílias, nomeadamente aos órfãos e viúvas, e, por outro lado,
realizar acções de propaganda patriótica de apoio à nossa
intervenção. É neste último aspecto que se insere a obra de Beça
– um conjunto de pequenas histórias ficcionadas, baseadas nos
acontecimentos relatados na imprensa nacional e estrangeira,
redigidas de forma apelativa para o leitor comum. Ao longo das
suas páginas encontramos narrados, de forma mais ou menos
romantizada, vários episódios de guerra. O autor, valendo-se dos
seus conhecimentos livrescos, como ele próprio afirma na
introdução, mas também, certamente, socorrendo-se da experiência
obtida enquanto fora militar, consegue um conjunto de narrativas
de dimensões muito variadas, heróicas, umas, comoventes, outras,
quase na sua totalidade sobre os exércitos aliados, algumas
sobre os portugueses, umas mais realistas do que outras. E
finalmente, a encerrar a obra, a sua acerba crítica ao
historiador Blasco Ibanez, que vinha acompanhando o desenrolar
da guerra com a publicação de uma história da mesma, porém, sem
nunca se referir à participação portuguesa. Para o nosso antigo
militar era falha imperdoável que ele procurou colmatar chamando
a atenção, publicamente, a Ibanez para corrigir a falta – o que
não foi feito. Termina assim, com uma súbita e amarga nota de
realidade o livro que é exemplo do que pode ser o contributo de
um homem de letras para o esforço de guerra.
Ana Homem de
Melo | Lisboa, GEO, Maio 2015
|
|