col. Biblioteca-Museu República e Resistência

A obra que disponibilizamos este mês é diferente do que temos trazido a público até agora, pois são os discursos que António José de Almeida proferiu na cerimónia em honra dos Soldados Desconhecidos. A necessidade de homenagear os combatentes mortos na I Grande Guerra fez-se sentir em toda a Europa, nos anos imediatos ao conflito, dado o grau de destruição e morte a que o continente assistira. Assim, primeiro em Inglaterra e depois em França (em 1920) organizaram-se as cerimónias que levaram ao enterramento de um soldado em Westminster (Londres) e um soldado sob o Arco do Triunfo (Paris) simbolizando todos os caídos em batalha. Em Portugal, foram inumados dois soldados, um morto na Flandres e outro em África, os quais foram solenemente acompanhados desde o seu ponto de origem até ao Mosteiro da Batalha, onde repousam acompanhados de uma chama perpetuamente acesa e, desde 1958, sob o olhar protector do Cristo das Trincheiras, imagem sobrevivente dos combates em Neuve La Chapelle, no sector português. Os corpos dos soldados desconhecidos, chegaram a Lisboa a 6 de Abril de 1921 tendo sido colocados no Arsenal da Marinha. No dia seguinte, foram transportados para o Congresso da República onde perante convidados nacionais e estrangeiros, nomeadamente representantes das forças aliadas (inclusive o General Joffre), o então presidente da República, António José de Almeida, pronunciou os dois discursos que apresentamos. No primeiro, Almeida reafirma a unidade entre Parlamento e Militares na decisão da participação e no esforço de guerra, elogiando, como não podia deixar de ser, os soldados portugueses. Enaltece a escolha do Mosteiro de Santa Maria da Vitória na Batalha, onde já repousam outros grandes Portugueses combatentes pelo país, e onde crentes e não crentes (recorde-se que a I República não assumira nenhuma religião como oficial, advogando a liberdade religiosa) encontrariam o necessário recolhimento perante os heróis. O segundo discurso, são apenas breves palavras que acompanharam a condecoração com as insígnias da Ordem da Torre e Espada, a mais alta condecoração militar portuguesa, mas que realçam a ideia de que é através destes dois desconhecidos que se homenageia todo o povo. Após esta cerimónia, os féretros ficaram expostos no Congresso para que fossem velados pela população. No dia 9 de Abril de 1921, dia em que se assinalava mais um aniversário da Batalha de La Lys, foram conduzidos até Leiria e a 10 de Abril, para o mosteiro da Batalha. Ao longo destes dias, grandes multidões acompanharam as cerimónias, que assim, procuraram homenagear tantas das vítimas da guerra, como manter na memória nacional a participação portuguesa num dos maiores conflitos mundiais. A reportagem jornalística destas cerimónias foi publicada na imprensa da época, nomeadamente na Ilustração Portuguesa n.º 790, de 9 de Abril, e n.º 791, de 16 de Abril de 1921.

Ana Homem de Melo | Lisboa, GEO, Abri 2015