Veja a canção vencedora

O ano da primeira grande expetativa de vitória de Portugal. Quando os responsáveis da RTP receberam os 313 temas, escolheram dez e convidaram Amália Rodrigues para fazer parte do júri não sonhavam, seguramente, de que este ficaria para a história como a edição mais marcante da nossa presença no Eurofestival da Canção. A RTP decide realizar pela primeira vez o concurso fora do Lumiar, preferindo o Teatro S. Luiz. O Chiado ornamentou-se com a promoção das diferentes canções finalistas. Num ambiente requintado e com um cenário inédito em termos da sua publicitação antecipada (O Século Ilustrado), este era um espetáculo “digno de inaugurar a televisão a cores” (Diário de Notícias). O aparecimento de novos nomes no festival e a receita da noite para a Liga Portuguesa Contra o Cancro eram factos interessantes, noticiados pela imprensa. Tal como o deserto das ruas, a concentração de gente nos cafés e a lotação de teatros e cinemas de Lisboa muito abaixo dos outros dias. A expetativa era grande. No final, a vitória de “Desfolhada”, cantada por Simone de Oliveira, colheu unanimidade na sala e na imprensa – “quem ganha um festival, ganha-o com gosto” (O Século Ilustrado). Por certo, também, junto dos portugueses: “todo o país votou em Desfolhada” (Diário de Notícias). Todo o país ficou espantado com as palavras de um poeta convertido às cantigas, Ary dos Santos, de quem se ouviu dizer que tinha concorrido porque precisava de dinheiro para mobilar a sua nova casa. Em Madrid, a imprensa portuguesa (Flama) oferece aos leitores a possibilidade de assistirem ao vivo ao espetáculo e nunca a imprensa estrangeira elogiaria tanto a canção portuguesa que, até à hora do espetáculo, era considerada favorita. Mas outros interesses se sobrepuseram, dando a vitória (ex-aequo) a quatro outros países. Sobre a presença portuguesa, os comentários referem: “Decepção” (Diário de Notícias), prejuízo “em função de compadrios, de habilidades de bastidores e de interesses visivelmente comerciais” (O Século), “a comédia, o yé-yé, o grande jogo dos lançadores de discos, as afinidades linguísticas e ideológicas, a politiquice” (Diário de Notícias). Dois dias depois, a delegação portuguesa chegaria a Santa Apolónia, onde a espera uma autêntica multidão. Simone de Oliveira “chegou vencedora. É justo” (O Século Ilustrado). A RTP decide não participar no ano seguinte, por considerar injusto o sistema de votação e, por consequência, o resultado nacional. Nem toda a imprensa concordaria com a saída de cena.

 
       

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Flama, 7 de Fevereiro de 1969, págs. 48-49
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