CANÇÕES
António Botto

A primeira edição das Canções do poeta António Botto, em 1920, pela Imprensa Libânio da Silva, foi praticamente ou propositadamente ignorada pela ‘grande’ imprensa. Num país europeu, católico, que vivia sobre a pressão das mudanças desencadeadas pela Grande Guerra e a emergência e propagação de novas ideologias e regimes (comunismos, fascismos), tempo de ‘crises’ diversas, não seria prudente dar realce a um poeta que cantava, em tom confessional, a beleza masculina e o amor homossexual. Assim, o escândalo moral alimentado por conversas de café acabou por se diluir na «escandaleira política» daqueles tempos.

Mas dois anos depois, 1922, quando saiu a 2.ª edição, sob a chancela da jovem editora Olisipo fundada por Fernando Pessoa, os comentários em surdina deram lugar ao ativismo, sobretudo por parte das forças católicas mais conservadoras, com manifestações nas ruas, distribuição de manifestos, reuniões com as autoridades para exigir a reposição da ordem e a moralização da vida pública. Este autodesignado movimento de «higienização moral» foi protagonizado pelos estudantes das escolas superiores de Lisboa e essa é, talvez, a sua faceta mais inusitada.

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