Historiador luso-brasileiro que empresta o seu nome à rua onde a Hemeroteca Municipal de Lisboa reabriu as suas portas, no passado dia 6 de Julho. A fim de homenagear o seu anfitrião e, simultaneamente, aguçar a curiosidade dos vizinhos do bairro e dar a conhecer o seu espólio e valências, a Hemeroteca considerou que era a ocasião certa para evocar a figura de Lúcio de Azevedo e sua obra. Afortunadamente, descobrimo-lo bem representado no espólio das bibliotecas de Lisboa (BLX) – incluindo na nossa colecção de periódicos, pois publicou na imprensa parte dos seus trabalhos historiográficos – o que permitiu a organização e montagem de uma mostra bibliográfica, que ficou associada à inauguração do novo espaço, e o “dossier” digital que agora se disponibiliza.

Nasceu em Sintra, a 16 de Abril de 1855, e fez estudos de Comércio no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa, que completou em 1872. No ano seguinte, somava então 18 anos, emigrou para o Brasil, para Belém do Pará, onde, segundo alguns dos seus biógrafos, estava instalado um tio que possuía uma empresa de exploração de borracha e de navegação fluvial. Por uma qualquer razão, não esclarecida, acabou por se empregar numa livraria que se tornou célebre na região, a Livraria Tavares Cardoso, o que não o impediu de colaborar nos negócios do tio. Uns anos depois, por razão de ter casado com a prima, Ana da Conceição Botelho, e de se naturalizar brasileiro, tornou-se herdeiro daquelas empresas. Consta que também se fez proprietário da referida Livraria.

Foi neste cenário de contacto com um “mundo novo” e também de algum privilégio, quer no plano económico e social, como no do acesso conhecimento, que João Lúcio de Azevedo descobriu o interesse pela História, dedicando-se concretamente ao estabelecimento dos portugueses no Pará, com enfoque no exilio dos cristãos-novos, na acção dos jesuítas, contrabalançado pela figura do Padre António Vieira, e nas políticas pombalinas. Os seus primeiros trabalhos foram, pois, publicados na imprensa local, e em 1893, reunidos na forma de livro, sob o título «Estudos de história parense». A obra recebeu os louvores do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e, no final do ano seguinte, foi proposta a admissão de Lúcio de Azevedo como «sócio correspondente» – conforme consta no Boletim publicado pelo Instituto –, o que se veio a consumar em 1895. Há ainda notícia do lançamento, em 1899, do livro «O Livre Amazonas – vida nova», que também reuniu crónicas publicadas na imprensa paraense. A confirmar-se, essa apresentação verificou-se já depois da sua saída do Brasil, pois antes de regressar a Portugal, o que aconteceu em 1900, terá passado uns anos em Paris, onde procurou complementar e atualizar a sua formação como historiador.

Depois de fixar residência em Lisboa, Lúcio de Azevedo deu prosseguimento às suas investigações e estudos, cultivando relações e amizades com as principais figuras da historiografia nacional, integrando-se nas suas instituições, como a Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos e a Academia de Ciências de Lisboa, e tornando-se colaborador das respectivas publicações periódicas. Mas também manteve o contacto com os historiadores brasileiros, partilhando informações, recursos e ideias. Concluindo, foi por conta das matérias em que continuou a centrar a sua atenção, como por via desses laços de amizade e colaboração, que Lúcio de Azevedo se fez um historiador luso-brasileiro, reconhecido dos dois lados do Atlântico. Como tradução desse apreço, recordamos a exposição organizada pela Câmara Municipal de Lisboa, no Palácio Galveias, em 1955, para assinalar o centenário do seu nascimento. Foi inaugurada a 16 de Maio, na presença das mais altas personalidades do Município. A homenagem contemplou ainda o descerramento de uma lápide no prédio onde Lúcio de Azevedo viveu e faleceu, a 5 de Novembro de 1933, sito no n.º 9 da Avenida de Berna, e que ainda lá se encontra. A calendarização do evento não foi certamente alheia à visita oficial do presidente do Brasil, que desembarcou em Lisboa poucos dias depois. 

Quanto à integração de João Lúcio de Azevedo na toponímia da Cidade, que também configurou uma homenagem, ocorreu uns anos mais, em 1979, tendo sido tornada pública por Edital, de 14 de Maio. 

Da sua vasta obra é unanime o destaque das «Épocas de Portugal Económico», de 1929, pela sua natureza pioneira no panorama historiográfico nacional. A sua dedicação e competência valeram-lhe ainda o reconhecimento da Real Sociedade de História de Londres. Embora hoje se considere que as interpretações históricas de Lúcio de Azevedo são limitadas e marcadas pelo tempo, as suas investigações continuam a fornecer material não desprezível para a escrita da História.

6 de julho de 2015

Rita Correia

 
     
 

Saiba mais sobre a vida e obra de João Lúcio de Azevedo em:

CORRÊA FILHO, Virgílio. "João Lúcio de Azevedo. Historiador luso-brasileiro". In Revista de História da Universidade de São Paulo, n.º 24 (4.º trimestre de 1955), pp. 425-143, disponível aqui.

 
     
 

FICHA TÉCNICA

João Lúcio de Azevedo (1855-1933) : mostra bibliográfica | Investigação e Textos: Rita Correia (HML) | Digitalização e tratamento de imagem: Serviço de Digitalização e Imagem da Hemeroteca Municipal de Lisboa | Conceito e webdesign: João Carlos Oliveira