Foi no Coliseu dos Recreios, a 29 de Março de 1974, no final do 1.º Encontro da Canção Portuguesa, e onde se juntaram, como nunca até então, tantos cantores da música de intervenção, que três mil pessoas se ergueram para com eles cantar Grândola, vila morena. “Grândola fora a única canção que não sofrera cortes da Censura e que sintetizava tudo o que desejávamos dizer a milhares de pessoas nessa noite”.

Grândola, vila morena fora escrita por Zeca Afonso em 1964, em homenagem à Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense, onde o Zeca atuara juntamente com Carlos Paredes. Mas só foi cantada a primeira vez ao vivo em 1972, na Galiza, em Santiago de Compostela. Seguiu-se, em 1973, a gravação em disco.

Nessa noite no Coliseu, “Milhares de pessoas de pé, abraçadas, de isqueiros acesos” acompanharam Zeca Afonso e saíram “a cantá-la, já depois da 1 hora da manhã, para uma Lisboa cheia de polícias a cavalo, de carros de água e de agentes com pastores alemães pela trela […]. Todos sentíamos que algo de decisivo estava prestes a acontecer, mas ignorávamos como, quando e onde”. (Letria, José Jorge, E tudo era possível: retrato de juventude com Abril em fundo, Lisboa, Clube do Autor, 2013 p. 151 e ss.).

Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Lourenço eram dois dos muitos militares opositores ao regime que estavam nesse concerto, e foi ao ouvir, de três mil vozes, as palavras “O povo é quem mais ordena / Dentro de ti, ò cidade” que perceberam que estava escolhida a senha musical para o levantamento do 25 de Abril.

Isabel Novais
Serviço de Fonoteca