col. Hemeroteca Municipal de Lisboa

O ESPELHO : JORNAL ILLUSTRADO (Londres, 1914-1919) – Jornal ilustrado de propaganda inglesa, destinado a Portugal e ao Brasil. Embora a Brazilian Associated Press conste como responsável pela publicação, ao que parece era na verdade um produto da agência de propaganda War Propaganda Bureau, fundada pelos ingleses em Agosto de 1914, para contrapor à eficiente máquina de propaganda alemã e para promover os interesses e a imagem da Inglaterra e da Coroa Inglesa. A dinâmica propagandística da War Propaganda Bureau ficou corporizada numa serie de periódicos (jornais e revistas), tendo por alvo diferentes públicos, preparados em diferentes línguas e profusamente ilustrados, designadamente: os jornais America Latina, em espanhol; Hesperia, em grego; Al Hakikate, em língua árabe; e as revistas Cheng Pao, em chinês; ou War Victorial, multilíngue. Comparando-os, facilmente nos apercebemos que funcionavam “em rede”, partilhando artigos, fotografias e ilustrações, que também eram publicados pelo The Illustrated London News, o Daily Mirror, o The Graphic e outros. Mas a “guerra de propaganda” não se ficou pelos periódicos, também usou outras “armas”, como seja: cartazes, gravuras, postais, panfletos e até livros (de natureza literária e também ensaística).

O Espelho só começou a circular em Portugal a partir de Outubro de 1915, (n.º 12), antecedendo, portanto, a declaração de guerra da Alemanha e a intervenção portuguesa no conflito. Tanto quanto foi possível indagar só a partir dessa data o jornal ilustrado passou a apresentar, no cabeçalho, o preço de venda avulso em moeda nacional (8 “centavos”) e no interior o preçário da venda por assinatura. Mas na edição anterior (n.º 11) já identifica os seus “agentes e correspondentes” em Portugal: em Lisboa, a «Casa Monaco», no Rossio, de Rodrigues & Comp.ª; e no Porto, a empresa «Magalhães & Moniz», no Largo dos Loyos. Mais tarde, em Fevereiro de 1916, anunciou a abertura de um escritório em Lisboa, do qual se encarregaria o «amigo e Sr. Alberto Rocha» (n.º 22, p. 2), que partira de Londres com essa missão. Posteriormente foi dado como endereço do escritório a «Rua dos Douradores, 110», em Lisboa.
 

A presença ou visibilidade de Portugal n’O Espelho assumiu alguma expressão a partir da declaração de guerra da Alemanha a Portugal, em Março de 1916. Considerando que O Espelho era um jornal de propaganda inglesa, merece sublinhado o facto de os artigos que nele foram sendo publicados, a partir de Março de 1916, não assumirem um discurso sintonizado com a tese da reserva inglesa à participação portuguesa na guerra, pelo contrário. Na verdade, o discurso publicado n’O Espelho não só revela empatia para com a «jovem republica» e denuncia e critica a ação politicamente desestabilizadora «de certos monárquicos lusitanos», como defende, aparentemente com orgulho, que o que movia Portugal para a guerra era a fidelidade portuguesa à velha aliança luso-inglesa - leia-se em: «A Inglaterra e Portugal» (n.º 12, de 12/08/1916, p.190) e «Portugal e a Guerra. A Mobilização do exercito portuguez» (n.º 13, de 26/08/1916, pp. 198-199). Dos vários artigos ilustrados e reportagens fotográficas que O Espelho dedicou à acção do exército português no “front”, sugere-se a leitura de: «O Glorioso Exercito Portuguez prepara-se para rechaçar os “Boches”» (n.º 14, 8/09/1917, pp. 212-213), no qual se enaltece as virtudes atávicas do exército português e se desmente as notícias forjadas pela imprensa alemã com base n’«uma série de declarações infames que prisioneiros portuguezes teriam feito», assegurando que a desmotivação e o desanimo dos soldados portugueses estava filiada no recrutamento forçado; «Os “Serranos”. As tropas portuguezas na França – a acção da 55 Divisão Britannica» (n.º 7, de 1/06/1918, p. 100), enaltece o modo como as tropas portuguesas, em articulação com as inglesas, enfrentaram e resistiram à ofensiva desencadeada pelos alemães nos meses de Março e Abril de 1918, no contexto da qual, «a infantaria alemã conseguiu abrir uma brecha nas posições portuguezas» e, posteriormente, «penetraram em uma posição britannica a norte de Festubert» (11 de Abril): «Na resistência oferecida pela 55 divisão, as tropas portuguezas tomaram uma parte apreciável e o sangue generoso dos serranos misturou-se no campo de batalha aos dos heróicos Tommies, os seus velhos alliados.».

Rita Correia | Lisboa, HML, abril de 2016