Efemérides | Exposição do Mundo Português (1940)
 
 


Em plena guerra civil de Espanha, quando os regimes autoritários pareciam impor-se na conturbada cena política europeia, o Estado Novo consolidava-se. É neste ambiente que, em 27 de Março de 1938, Salazar anuncia a realização, em nota oficiosa, de uma grande comemoração do duplo centenário da independência (1140) e da restauração (1640), para o ano de 1940. A iniciativa assumiu então, em termos de recursos materiais e humanos, uma dimensão inédita, tornando-se o mais importante acontecimento político-cultural do Estado Novo. O empenho político nas comemorações resulta da compreensão do que estava em jogo: passar ao acto (em forma de comemoração) a consagração pública de uma legitimidade representativa própria, desta feita, eminentemente ideológica e histórica. Ao invés da legitimidade eleitoral dos regimes democráticos, esforçou-se o Estado Novo por associar os traços mais marcantes do seu nacionalismo – autoritarismo, elitismo, paternalismo conservadorismo – a um passado mítico legitimador do presente.
 


 


Mais, buscou, pela mão dos artistas e a pena dos historiadores, difundir, com «a clareza» possível, essas linhas invisíveis da continuidade, que uniam a grandeza do passado, do presente e do futuro de Portugal. Corolário de uma «política de espírito», lançada na década anterior pelo audacioso director do Secretariado de Propaganda Nacional, António Ferro, assiste-se à mais conseguida conciliação da arte com a política no Estado Novo. Efémera e irrepetível, contudo. Ninguém escondia o valor propagandístico da exposição que o próprio António Ferro sintetizaria: «1140 […] explica 1640, como 1640 prepara 1940». Evocação histórico-ideológica dos momentos edificantes, recheados de heróis e lições exemplares. Espécie de fábula contada em imagens, símbolos, frases e palavras. A exposição ficaria como marco crucial da cumplicidade dos artistas com o Estado Novo ensaiada nos anos 30 e, simultaneamente, o seu ponto final e de viragem.
 



 



O certo é que, enquanto em Junho os portugueses assistiam pacíficos à inauguração da sua «cidade mítica», nas chancelarias acendera-se já o alarme – a guerra alastrava por toda a Europa. Quatro anos volvidos, e o jovem e vigoroso regime atravessaria a sua primeira crise política. A exposição viera afinal comemorar, em apoteose, o fim do ciclo mais sólido da sua existência.

Para saber mais, ver: BARROS, Júlia Leitão de, “Exposição do Mundo Português”, in BRITO, J. M. Brandão de, e ROSAS, Fernando (dir.), Dicionário de História do Estado Novo, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996, vol. 1, pp. 325-327; MÓNICA, Maria Filomena, “Exposição do Mundo Português”, in BARRETO, António, e MÓNICA, Maria Filomena (Coord.), Dicionário de História de Portugal, Vol. 7, Lisboa, Livraria Figueirinhas, 1999, pp. 710-711.
 



 


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