col. Biblioteca Municipal Central - Palácio Galveias

Armando de Almeida de Sousa Araújo nasceu em Lisboa em 1878 e viria a falecer na mesma cidade em 1962. Foi funcionário do Ministério das Colónias mas desenvolveu atividade literária quer em periódicos, quer como poeta. A partir de 1902 dirigiu O arco iris : jornal independente, litterario, illustrado e anunciador, que se publicou até 1908. Colaborou n’O Occidente, Novidades, Debate, A Voz, A Época.

Como poeta foi o editor responsável pelo terceiro número da publicação As Quadras do Povo: pamphletos revolucionários, onde publicou um poema sobre Guilherme Braga. Ainda no campo da poesia, lançou pequenas obras poéticas sobre assuntos vários. Este que hoje apresentamos, foi escrito em 1914, e reflete a emoção do início do conflito. O autor destinou-o ao Imperador Guilherme II da Alemanha, o último imperador alemão que conduziu o seu país para a I Guerra Mundial. Ao mesmo tempo, na folha de rosto, Armando Araújo transcreveu as palavras “Ás armas! Portugueses…” incitando Portugal a participar no conflito que se iniciava. A expressão latina que surge poderá ser traduzida como “o homem é lobo do homem, e cooperante com o homem” e foi utilizada, numa adaptação da frase original de Plauto, por Manuel de Arriaga no seu poema de 1898 “Á paz dos povos”.

A abrir a sua obra, uma cruz vermelha, sobre a qual o autor faz inscrever um poema dedicado a esta instituição – porém, quando lemos o texto, verificamos que, apesar de, de facto, o autor elogiar a ação da Cruz Vermelha, associa o seu símbolo à Cruz de Cristo que ornava as nossas caravelas (p. 10, última quadra) numa liberdade criativa do autor, pois a bandeira da Cruz Vermelha é a inversão da bandeira helvética, naturalidade do seu fundador, Henry Dunant.

O retrato que traça do Imperador Guilherme II, embora pleno de artifícios literários, corresponde à imagem que este monarca tinha à época: autoritário e belicista, embora tenha tentado que a Alemanha recuasse na sua posição agressiva, será submetido, de acordo com o poeta, ao julgamento da História no final do conflito (pp. 7-11). 

Araújo constrói o seu poema numa exaltação patriótica, apresentando os heróis portugueses de todas as épocas reunidos, entre os quais, Alfredo Augusto Freire de Andrade, referido pelas iniciais F. d’A., comandante de um dos combates das campanhas de pacificação de África; introduzindo a saudade como característica da essência portuguesa, a par da lealdade e da simplicidade do povo português. Mas contrapõe a esta franqueza das gentes portuguesas a falsidade dos discursos políticos, dos que apregoam a guerra sem nunca terem combatido, dos que tentam arrastar o país para o nascente conflito. Em sua opinião, Portugal deve honrar a aliança luso-britânica, mas apenas no caso do Reino Unido o solicitar. Só então o soldado português deverá avançar para a luta, tal como sempre fez ao longo dos séculos, provando o seu valor militar. Enquanto poeta, Araújo recorre à sua arte para defender esta posição equilibrada de participação no conflito, no cumprimento de tratados internacionais, em oposição às vozes que tentavam impelir Portugal a uma entrada repentina no teatro de operações europeu.

Ana Homem de Melo | Lisboa, GEO, janeiro 2016