Em Outubro de 1942, o cardeal Cerejeira afirmava: «Não foi a igreja que impôs Fátima, foi Fátima que se impôs à Igreja». A frase sintetiza o longo, complexo e por vezes tenso processo de construção e consagração do "milagre" junto da hierarquia católica. De alguma forma, no ano em que se celebra o centenário das aparições, Fátima também se impõe na agenda da Hemeroteca, e quando Portugal se prepara para receber o Papa Francisco, evocamos a primeira peregrinação papal ao Santuário da Cova da Iria: a de Paulo VI há precisamente 50 anos - 13 de Maio de 1967. Do ponto de vista da comunicação social foi, provavelmente, o acontecimento mais mediático a que até então se assistira. O País tornou-se o centro das atenções do mundo, pelo menos do católico; e essa visibilidade veio contrariar a política isolacionista do Estado Novo e foi fonte de inspiração e estímulo para os que se lhe opunham.

 
 

À partida, era expectável que a visita do Papa se prestasse a ser capitalizada pelo regime ditatorial; porém, a visita acabou por revelar-se especialmente mobilizadora e benéfica para as oposições, que reconheciam os seus anseios e preocupações projetados no discurso de Paulo VI e, portanto, descobriram na sua pessoa um estímulo à concertação e à união. De facto, Paulo VI liderava um movimento de renovação da Igreja que assumira a causa dos mais fracos e dos famélicos, e denunciava as injustiças sociais derivadas de um capitalismo feroz e alheado do progresso dos povos que fomentava a revolta e a guerra. Damos-lhe a palavra, reproduzindo um trecho extraído da sua 4.ª Carta Encíclica, de Março de 1967, que faz parte da obra Populorum Progressio, editada em Portugal, nesse mesmo ano, pela Aster Editora.

"As excessivas disparidades económicas, sociais e culturais provocam, entre os povos, tensões e discórdias, e põem em perigo a paz. Como dizíamos aos Padres Conciliares, no regresso da Nossa viagem O.N.U., «a condição das populações em fase de desenvolvimento deve ser objecto da nossa consideração, ou melhor, a nossa caridade para com todos os pobres do Mundo – e são legiões infinitas – deve tornar-se mais atenta, mais activa e mais generosa». Combater a miséria e lutar contra a injustiça, é promover não só o bem-estar mas também o progresso humano e espiritual de todos e, portanto, o bem comum da humanidade. A paz não se reduz a uma ausência de guerra, fruto do equilíbrio sempre precário das forças. Constrói-se, dia a dia, na busca de uma ordem querida por Deus, que traz consigo uma justiça mais perfeita entre os homens.
» "

 

Assim que a imprensa deu a notícia da visita do Papa Paulo VI, a 3 de Maio, o país entrou em rebuliço para preparar, em contra-relógio, a receção a Sua Santidade. Evento que, além de toda a solenidade protocolar, se queria envolto nas mais exuberantes manifestações de carinho e apoio à sua pessoa e ao propósito da sua peregrinação: a paz no mundo e o entendimento dos homens. As reportagens e as notícias publicadas por um grande número de periódicos dão testemunho de uma mobilização inédita de meios humanos, técnicos e materiais e de um movimento de gentes e oferendas sem precedentes. Com nuances de perspetiva e de análise, que refletiam diferenças ideológicas e políticas, os principais diários, semanários e revistas replicavam notícias sobre todos os preparativos que se desenrolavam no terreno; ao mesmo tempo que reportavam a opinião e o sentimento de diversas personalidades políticas e dignidades religiosas; reproduziam discursos e documentos; revelavam detalhes sobres as origens e o percurso de vida de Paulo VI; e evocavam a história das Aparições de Fátima, dos três pastorinhos e as principais etapas da história do culto e da consagração do Santuário. Para que possa ter contacto visual direto com a informação que foi então produzida, compusemos uma mostra de números extraídos de cerca de duas dezenas de publicações, de diferente natureza, que organizámos em 3 núcleos:

JORNAIS − incluímos os 4 diários selecionados, por sorteio realizado no Grémio Nacional da Imprensa Diária, para o cobiçado privilégio de acompanhar a viagem aérea de Paulo VI de Roma até Monte Real, no concelho de Leiria: o Diário de Lisboa que delegou a missão no «camarada de redacção Maurício de Oliveira»; o Diário do Norte, representado pelo seu director e editor, António Cruz; O Século que enviou o seu director interino, Miguel Figueira; e A Voz que se fez representar pelo seu diretor, Pedro Correia.

 
                              
 

Para complementar, juntámos ao escaparate dos jornais mais 6 títulos de Lisboa e Porto: Diário da Manhã, Diário Popular, Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Comércio do Porto, Novidades, todos eles denotando nas suas edições uma forte mobilização em torno do acontecimento.

 
                                                                      
 
                                                                
 

REVISTAS – reunimos números de 5 magazines diferentes, selecionados de entre os mais conceituados da época, dedicados á visita de Paulo VI, e onde estão “arquivadas” algumas das melhores imagens: a Eva, a Flama, o Século Ilustrado, a Vida Mundial e ainda o Lisbon Courier.

 
 
                                     
 

PERIÓDICOS DEDICADOS AO CULTO DE FÁTIMA - no qual incluímos a coleção completa de Fátima 50 : revista mensal de actualidades documental e ilustrada (1967-1970), que foi dirigida pelo Cónego Dr. José Galamba de Oliveira, e deve a sua fundação ao 50.º aniversário das aparições; a coleção completa de Fátima - Altar do Mundo (1953-1967), um "suplemento informativo", publicado sob a direção de João Ameal, que acompanhava cada fascículo da obra de maior fôlego, e com o mesmo título, lançada pela Editora Ocidente, do Porto, com o objetivo de "dilatar a fé" em Nossa Senhora de Fátima no Mundo; o número de Julho-Agosto de Mensagem de Fátima (editou-se entre 1953 e 1967), suplemento do Boletim Mensagem, da paróquia do Fundão; os números de Maio e Junho de Stella : revista católica de cultura feminina, das Religiosas Reparadoras de N.ª S.ª das Dores de Fátima (com início de publicação em 1937); os doze números de 1967 de Voz da Fátima, que à data estava sob a direção do Monsenhor Manuel Marques dos Santos, do Seminário de Leiria. Este último é o mais antigo projeto de comunicação do Santuário de Nossa Senhora do Rosário de Fátima (começou a editar-se em 1922) e mantém-se em publicação, com uma tiragem de 80.000 exemplares. Mas a coleção da Hemeroteca não se esgota nas publicações agora digitalizadas. Existem muitas mais, provenientes das mais variadas geografias nacionais, que poderão ser consultadas em papel.

 
 
                                 
 
 

A generalidade da imprensa contribuiu, voluntária e ativamente, para a projeção e mediatismo que a visita de Paulo VI alcançou. Os profissionais da comunicação que cobriram as cerimónias mereceram inclusivamente uma benção especial do Papa. Além do significado religioso, a visita do Papa constituiu "um extraordinário acontecimento sob o ponto de vista da Informação. Centenas de jornalistas de todo o Mundo, homens da Imprensa, da Rádio, do Cinema e da televisão deslocaram-se ao nosso País", como assinalou o Sindicato Nacional dos Jornalistas, no segundo número (de Julho de 1967) de Jornalismo (1967-1983), jornal da "classe", onde publicaram um interessante balanço sobre o trabalho realizado pela imprensa portuguesa.


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FICHA TÉCNICA

13 DE MAIO DE 1967 : A VISITA DE PAULO VI A FÁTIMA | Coordenação do projeto: João Carlos Oliveira | Pesquisa de conteúdos: Rita Correia  | Digitalização e tratamento de imagem: Anabela Ferreira e Joaquina Cunha | Conceito e webdesign: João Carlos Oliveira 

 
 

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