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Escrito e composto em 1962, editado em 1963, Vampiros
constitui o primeiro tema de Zeca Afonso claramente
denunciador da repressão política e da atuação dos agentes da
PIDE, que “No céu
cinzento sob o astro mudo / Batendo as asas pela noite calada
/ Vêm em bandos com pés de veludo / Chupar o sangue fresco da
manada”. Foi também, juntamente com O menino do bairro negro,
a sua primeira canção a ser proibida pela Censura.
Nas palavras de Zeca
Afonso, “Numa viagem que fiz a Coimbra apercebi-me da
inutilidade de se cantar o cor-de-rosa, o bonitinho, muito em
voga nas nossas composições radiofónicas e no nosso music-hall
de exportação. Se lhe déssemos uma certa dignidade e lhe
atribuíssemos, pela urgência dos temas tratados, um mínimo de
valor educativo, conseguiríamos talvez fabricar um novo tipo de
canção cuja actualidade poderia repercutir-se no espírito
narcotizado do público, molestando-lhe a consciência adormecida
em vez de o distrair. Foi essa a intenção que orientou a génese
de Vampiros […].” (José Afonso, Cantares, coord.
de Manuel Simões e Rui Mendes, Coimbra, Fora do texto, 1995, p.
102).
Germano de Sousa (ex-bastionário
da Ordem dos Médicos), que na altura estudava em Coimbra, conta.
“[O Zeca] ia muito à minha república, nessa altura, e um dia
apareceu-me lá de manhã. Eu tinha ido para a farra, […] ainda
estava na cama. Ele entra-me por ali adentro, acompanhado da
segunda mulher [….]. Vira-se para mim e pergunta-me: «Sabes
música?». «Ó Zeca, não, não sei […]. «E não tens um gravador?»,
«Gravador? Se tivesse um gravador, já o tinha posto no prego».
«Eh, pá, que chatice! É que eu tenho uma música na cabeça e
ainda a vou perder». Ele era assim: compunha na cabeça e, se não
registava logo, esquecia-se. […]. «Ó Zeca, o que eu posso fazer
é ir buscar a viola; sou um péssimo tocador, mas sempre arranho
qualquer coisa. Faço uns desenhinhos das cordas no papel, tu
vais-me dizendo as notas, e eu vou pondo. Nota 1 na escala tal,
nota 2 na escala tal…» Assim fizemos. E ele lá se pôs a
trautear”. Eram as primeiras notas dos Vampiros.
(entrevista com Germano de Sousa in
Adriano Correia de
Oliveira, textos, org. e coord. José Niza, [Lisboa], Público
Comunicação Social SA, D.L. 2007, vol. 3, p. 30.)
Isabel Novais
Serviço de Fonoteca
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