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Nas vésperas do 25 de Abril, as dificuldades financeiras do povo
português, o futebol e os festivais da canção (da RTP e o
eurovisivo) eram temas propalados nas páginas de Os Ridículos,
na série editada em 1974 e 1975 e dirigida por Silva Nobre, na
rua do Conde Redondo (n.º 12), em Lisboa. A edição de 27 de
abril abre com uma frase premonitória: “Já estão fartos de me
aconselhar a ir para a política… mas eu gostava mais de um
emprego decente e honesto!” (Zé Povinho). Foi escrita e editada
antes do pronunciamento militar, pois o “mais antigo semanário
humorístico português” esperaria mais de uma semana após os
acontecimentos do 25 de Abril para a eles se referir (4 de
maio). A capa é elucidativa: sob um fundo vermelho e o perfil de
uma fábrica, um operário exalta o seu contentamento, de punhos
cerrados, exclamando: “Que limpeza só numa semana!!..”. O
desenho é de Ferra, caricaturista de serviço deste semanário.
Aliás, é dele a maior parte das referências à mudança de regime.
Nas páginas interiores, desenha as caricaturas imaginadas de
cinco figuras em redor de um Zé Povinho que parte as grades da
prisão. A eles, pergunta-se: “Ora conte-nos que pensa do 25 de
Abril”. – “Eu julgava que sabia o que era porrada!” (ex-P.I.D.E./D.G.S.),
“O que é que eu hei-de cortar agora? Mas só tenho tesoura… não
tenho serrote!...” (ex-Censor), “Agora é que eu quero ver para
que serve o desemprego” (ex-Tachista), “Estou desempregado só
porque aquele tipo se esqueceu dos canhões em casa!... (ex-Legionário),
“Deixa passar esta linda brincadeira… do bailinho da Madeira!
Olha se não me abaixo!...” (Marcelo [Caetano]) e “Mais vale
tarde do que nunca” (Zé Povinho). Os textos que à mudança se
referem ironizam, por exemplo, aqueles que, afinal, se diziam
nunca ter sido alinhados com o regime deposto, ou uma entrevista
televisiva a um alfaiate do povo que se alegra pela quantidade
de casacas para virar e, ainda, a passagem à primeira divisão do
clube de todos nós… Portugal. O tema da mudança de regime ainda
se sentiria, com natural destaque, em edições seguintes deste
semanário, que não ultrapassaria o Verão Quente (1975).
Jorge Mangorrinha
Hemeroteca Municipal de Lisboa |
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